O IMPIEDOSO MUNDO DE LAMEQUE
Pr. Adaylton de
Almeida Conceição
Caim representa
não somente a origem daquilo que virá a ser a expressão do mundo com as suas
concupiscências más. Ele é, antes, a representação de um sistema falso de
adoração a Deus. Caim tinha fé em Deus
(ao menos de que Ele existia e devia ser adorado) e trouxe suas ofertas ao
Senhor, mas não com inteireza de coração.
Caim possuía fé, mas não a fé salvífica que dá crédito somente a Deus
pela redenção. Uma fé não salvífica leva a buscar formas de adoração espúrias.
O fato é que
Caim teve olhos maus sobre a adoração legítima de Abel. Sua indisposição contra
seu irmão foi apenas um reflexo de sua indisposição para com o próprio Deus.
Tem sido assim na história desse mundo desde o início e o será até o fim. Os
cristãos fiéis devem esperar por sofrimento e reprovação do mundo mas há uma
promessa de recompensa (Hb. 11.4, Mt. 5.10-11). Fora do relato de Gênesis 4 Caim
é citado como nome de cidade uma vez (Js. 15.57) e como exemplo de impiedade em
três outros textos (Hb. 11.4 – em oposição a Abel, I Jo. 3.12 – onde é dito que
ele era do maligno devido seu caráter mau, e em Jd.11 – como exemplo da
corrupção e brutalidade irracional que a iniquidade dá origem.
O MUNDO DE LAMEQUE
Depois da
história da primeira família, encontramos em Gênesis 4 e 5 duas genealogias.
Uma é a descendência de Caim, a outra a de Sete. Ambas terminam com a breve
descrição de uma família.
A primeira é a
casa de Lameque. “Lameque tomou para si
duas esposas: o nome de uma era Ada, a outra se chamava Zilá. Ada deu à luz a
Jabal; este foi o pai dos que habitam em tendas e possuem gado. O nome de seu
irmão era Jubal; este foi o pai de todos os que tocam harpa e flauta. Zilá, por
sua vez, deu à luz a Tubalcaim, artífice de todo instrumento cortante, de
bronze e de ferro; a irmã de Tubalcaim foi Naamá. E disse Lameque às suas
esposas: Ada e Zilá, ouvi-me; vós, mulheres de Lameque, escutai o que passo a
dizer-vos: Matei um homem porque ele me feriu; e um rapaz porque me pisou. Porque sete vezes Caim será castigado; mas Lameque setenta vezes sete.”
(Gênesis 4.19-24).
O relato bíblico
termina o capítulo 4 com a descendência a partir de Caim. Tomando-se Adão como
o primeiro tem-se: 1-Adão, 2-Caim, 3-Enoque, 4-Irade, 5-Meujael, 6- Metusael,
7-Lameque. O relato das genealogias tem uma pausa para expor algo a respeito de
Lameque. Dele se narra o primeiro canto na Bíblia, e é um canto de orgulho pelo
fato de ter matado um homem e um rapaz.
Além desse fato nota-se o primeiro
relato de bigamia, pois ele tomou duas mulheres para serem suas esposas.
Lameque representa o processo de endurecimento que o pecado causa,
progressivamente, naqueles que rejeitam a Deus e vivem de acordo com seus
próprios desígnios.
O maior de todos
os bens que possui um ser humano é a vida. Em defesa da qual há contingente
crescente de pessoas, embora, represente uma minúscula gota no mar. De outro
lado, o desprezo pela vida vem num crescente geométrico.
Matar alguém é
crime, assegura o Código Penal Brasileiro, há, porém, atenuantes e agravantes
nesse ato humano. Em defesa de sua própria vida matar passa a não ser crime; de
sorte que também não o é quando em pleno exercício do dever profissional, ou
ainda em face de estado de necessidade. Já os motivos banais, a intenção
deliberada, por vezes planejada, de matar afirma a posição de agravante –
consuma-se o dolo.
Lameque, o precursor da poligamia.
“Lameque tomou para si duas mulheres: o nome
duma era Ada, e o nome da outra Zilá.” (Gn 4.19)
Lameque
mencionado no livro de Gênesis como filho de Metusael e um dos descendentes de
Caim da quinta geração (Gn 4.18-19), foi o primeiro homem a praticar a
poligamia (Gn. 4.19) e também era um assassino que matou um homem e um jovem (Gn. 4.23). Lameque e os seus filhos foram muito influentes na história da
humanidade. Infelizmente, como Caim, a sua influência não foi para o bem. Esta
família fez grandes progressos, mas nenhum deles foi de âmbito espiritual.
A Bíblia diz que
Lameque teve duas esposas. O nome da primeira era Ada que teria sido mãe de
Jabal, que foi o pai dos que habitam em tendas e possuem gado e de Jubal, pai
dos músicos (Gn. 4.20-21). A segunda esposa chamava-se Zilá que foi mãe de
Tubal-Caim, o primeiro ferreiro e de sua irmã Naamá (Gn. 4.22).
Os descendentes
de Caim deixaram um legado de iniquidade e maldade. Tornaram-se autossuficientes e a violência cada vez mais se multiplicava gerando uma
sociedade hostil e competitiva. Começava o olho por olho, dente por dente. Esta
era uma geração assassina e sábia.
NÃO PISE NO MEU CALO
“E disse Lameque [...] escutai o que passo a
dizer-vos: Matei um homem porque ele me feriu; e um rapaz porque me pisou”
(Gênesis 4.23).
Você já ouviu ou
pronunciou a frase: “não pise no meu calo”. Quem pronuncia essa expressão está
mandando um recado: “não me ofenda, pois do contrário você sofrerá as
consequências”. No texto acima um homem chamado Lameque se vangloria por ter
matado um rapaz só porque ele pisou no seu pé. Lameque era adepto da filosofia
“Pisa. Mas quando eu levantar, corre”. Lameque é o segundo assassino mencionado
na Bíblia. O primeiro foi Caim.
Lameque é um
exemplo a não ser seguido por algumas razões. Vejamos:
Primeira,
Lameque se vangloria de ser um homem violento. Lameque tem prazer em alardear
sua violência. Leia novamente suas palavras: “escutai o que passo a dizer-vos:
Matei
Segunda, Lameque
banaliza a vida humana. Para Lameque as pessoas não valiam nada. A violência é
a demonstração mais vil de que a vida humana não tem valor. Matar um jovem por
causa de uma pisada no pé é não ter nenhum respeito à vida humana.
Terceira,
Lameque não gosta de sentir dor, mas fere as pessoas. Lameque não gosta de ser
pisado, mas pisa as pessoas. Lameque tipifica aquelas pessoas que não gostam de
ser machucadas, mas têm prazer em machucar os outros.
Quarta, Lameque
é avesso ao perdão. Lameque não conhece a palavra perdão. Perdão é uma palavra
desconhecida no vocabulário de Lameque. Infelizmente, muitos à semelhança de
Lameque, preferem retribuir a ofensa na mesma intensidade ou em grau superior do
que liberar perdão.
Lameque matou
porque lhe pisaram. Imaginem quantos pisam e são mortos pelo ato de pisar. Ou
quantos haverão de perder a vida diante de lameques dispersos mundo a fora,
pelo que há desproporção como resposta à fúria descabida da gana por matar!
Lameque
banalizou o bem maior: a vida! Tornou-a uma mera passagem. Gerou lameques que,
em nossos dias, tiram a vida do seu próximo por motivos fúteis.
Lameque, o compositor
Lameque é,
também, como já nos referimos, o primeiro compositor de hinos, a expressão “ouvi a minha voz” em Gênesis 4.23,
refere-se a um poema ou hino. As palavras deste hino revelam quão ímpio Lameque
era. Neste hino, explica às suas esposas que matou um rapaz em legítima defesa.
Seu crime não foi premeditado. Ele não se orgulha somente de sua vingança, mas
diz que faria mais para se vingar do que Deus poderia ter feito para vingar
Caim se ele tivesse sido morto. O orgulho de Lameque e sua confiança foram
inflamados pelo fato de seu filho Tubalcaim ter feito a primeira espada ou
lança.
A canção de
Lameque tem um tom de auto justiça. No versículo 24, ele parece justificar suas
ações. Este pensamento parece estar implícito: "Eu sou mais justo do que
Caim, pois eu matei quem merecia morrer, portanto, quem me ferir, deve ser
duramente vingado". “Se Caim há de ser vingado sete vezes, com certeza
Lameque o será setenta e sete vezes”. A proporção não é em função do castigo
dado a quem matasse Caim, mas em relação ao número de assassinatos. Lameque
matou duas pessoas, enquanto Caim matou uma.
Esse breve
relato deixa evidente que Lameque tinha todas as características de seu
antepassado Caim. Suas palavras e seus atos demonstram que se havia distanciado
ainda mais de Deus e de Sua Palavra que Caim. Em conformidade com os
pensamentos de Deus, Caim havia tomado para si uma esposa. Frequentemente se
pergunta onde ele conseguiu essa mulher. Só há uma clara resposta bíblica. Adão
“gerou filhos e filhas” (Gênesis 5.4). Deus “de um só (ou seja, de Adão) fez
toda a raça humana” (Atos 17.26). Portanto, Caim se casou com uma de suas
irmãs.
Lameque, por sua
vez, agiu em claro desacordo com as intenções de Deus e tomou para si duas
esposas. A poligamia é uma prática contrária à ordem estabelecida por Deus na
criação (Gênesis 2.24). Quem conhece a Bíblia, sabe que Deus tolerou a
poligamia, mas nunca a aprovou. Consequentemente, verificamos que esse mal
sempre teve o seu devido castigo.
Lições que nos deixa a história de Lameque
A história de Lameque e de sua família deixa
uma séria advertência para nós e nossas famílias. Não é pecado almejar que
nossos filhos recebam uma boa educação. Evidentemente também não é pecado
exercer uma boa profissão ou um ofício neste mundo. Se trabalhamos na
agricultura, na cultura ou na indústria, isso não tem muita relevância — desde
que possamos exercer nossa profissão em comunhão com Deus e que Ele seja
honrado.
Nós, os cristãos,
não pertencemos mais a este mundo. Deus “nos libertou do império das trevas e
nos transportou para o reino do Filho do seu amor” (Colossenses 1.13). Por
graça, fazemos parte daqueles que o Pai tirou do mundo e deu a Seu Filho (veja
João 17.6). Mas ainda estamos neste mundo. Por isso, temos que cumprir um papel
que implica muitas responsabilidades.
Lameque nos leva
ao ponto da história do homem onde o pecado não é apenas cometido
descaradamente, mas com prepotência. Ele se vangloriou de seu assassinato para
as suas mulheres. Mais que isso, ele se gabou de que seu pecado foi cometido
contra um rapaz que simplesmente o ferira. Este assassinato foi brutal, ousado
e vão. Pior de tudo, Lameque mostra desdém e desrespeito para com a Palavra de
Deus: “Se Sete vezes se tomará vingança de Caim; de Lameque, porém, setenta
vezes sete.” (Gn. 4.24).
Deus tinha
pronunciado estas palavras para garantir a Caim que ele não seria morto pelas
mãos de um homem. Ele também preveniu aos homens sobre a gravidade de tal ato.
Estas palavras foram pronunciadas para mostrar o fato de que Deus valorizava a
vida humana. Lameque as torceu e distorceu como ostentação de sua violenta e
agressiva hostilidade para com os homens e para com Deus.
O pior e o mais
trágico: ecoa também nos púlpitos pragmáticos pós-modernos, com escusas de amor
pelo mundo (ver I João 2.15-17).
Toda geração que
toma para si o cântico de Lameque, vangloriando-se de suas maldades, também
sofrerá juízo, pois não encontrará lugar no plano de DEUS, pois nem O aceitam,
nem O honram, nem O desejam (ver Romanos 1.18-32).
O plano do diabo
era o de claramente impedir o cumprimento da promessa do Redentor (Gen. 3.15),
para isso buscou corromper de tal forma a humanidade a ponto de ser impossível
haver uma “linhagem messiânica” para que o Verbo pudesse se fazer carne.
Os homens
anteriores ao dilúvio, com exceção dos descendentes de Sete; não se preocupavam
com outras coisas, a não ser: comer, beber, casar, separa-se e tornar-se a
casar. Será que isto é diferente dos dias atuais? Será que a sociedade
amadureceu e agora está com seus olhares voltados para Deus o SENHOR? A
resposta é não, estamos em dias iguais aos anteriores ao dilúvio, onde os
homens, só pensam em comer, banquetear, beber e fazer festas onde existam o
maior número possível de beberrões, onde os homens perderam o respeito e o
temor a Deus. Não é demais dizer que reeditamos e vivemos num mundo de Lameque,
onde nossos olhos estão voltados única e exclusivamente para nós mesmos.
Que Deus tenha
misericórdia de nós e que nos despertemos e comecemos a viver uma vida dentro
do Reino de Deus.
Pr. Dr. Adaylton Conceição de Almeida (Th.B.;Th.M.Th.D.;D.Hu.) (R.I.P.)
Blog: www.adayltonalm.spaceblog.com.br
(O
Pr. Dr. Adaylton de Almeida Conceição foi Missionário no Amazonas e por mais de
20 anos exerceu seu ministério na Republica Argentina, é Bacharel, Mestre e
Doutor em Teologia, Escritor, Professor Universitário, Psicanalista e Pós
Graduado em Ciências Políticas e em Psicanálise, Doutor HC em Psicologia e em
Humanidade, Diretor da Faculdade Teológica Manancial e Professor do Seminário
Teológico Kerigma).
BIBLIOGRAFIA
Carlos
Ribeiro – Lameque e sua família
Francisco
Ramos de Brito - A Cultura de Lameque
H. C. Leupold - Exposition of Genesis (Grand Rapids:
Baker-Book House, 1942)
Manoel
Neto – Não pise no meu calo
Ricardo Reis – Sobre o Perdão
Muito bom, parabéns.
ResponderExcluirGostei do texto é rico em palavras e claro entendi bastante.
ResponderExcluirEstudo maravilhoso, gostei muito.
ResponderExcluirGlória a Deus!
Belo comentário. Que Deus ilumine sempre.
ResponderExcluirEnriqueceu meu conhecimento e multipliquei nós cultos para mais de 1000. Obrigado pela tradução da palavra viva que se renova
ResponderExcluirMuito bom o texto pastor. Muito esclarecedor.
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